Relembrando esse fato divertido, não obviamente para o seu personagem principal, recordo-me da história do Wantring. Certa feita, o dito senhor, morador de Santa Tereza, no caminho de Rio do Sul, foi até essa cidade para fechar as contas da safra de fumo. Feitos os devidos cálculos, recebido o que lhe era devido, saiu da Companhia Souza Cruz, com uma razoável importância em dinheiro no bolso, resultado de toda a feria de um ano de duro trabalho nas estufas e roças. Mal saíra, já com planos diversos de como gastar o dinheiro,foi abordado por um senhor apessoado e bem vestido, mostrando-se ansioso, que lhe perguntou se saberia de alguém que estivesse interessado na compra de uma máquina de fazer dinheiro.
Tomado de surpresa, comentou que isso não existia, mas o desconhecido lhe afirmou categoricamente que tinha uma, mas como iria sair em viagem, não poderia levá-la junto, já que tal atividade, obviamente era clandestina e ilegal. Estaria disposto a vendê-la por uma módica soma. O Sr. Wantring, tomado pela ambição, mencionou que gostaria de ver a máquina, e assim foi levado até um lugar escondido, onde o "industrial" lhe mostrou a maquininha. Coisa maluca ... Colocava-se um papelzinho do tamanho de uma nota de dinheiro, em uma abertura da máquina, movia-se a manivela, e o "milagre" acontecia: do outro lado saia uma notinha novinha de sei lá, 500 mil reis, ou o que fosse na época.
O dono da máquina por duas ou três vezes repetiu a façanha, e de cada vez a geringonça fazia surgir, pela abertura adequada, nova "pelega", estalando de nova, tinta brilhando. Movido pela curiosidade e ambição, quis o Sr. Wantring, ele mesmo, acionar a máquina no que foi prontamente atendido. Moveu a manivela, e nova notinha de 500 mil réis …
Olhos deslumbrados, perguntou o preço e ficou bastante surpreso que o custo cabia perfeitamente em seu orçamento ... Era exatamente o valor que havia acabado de receber pelo ano inteiro de labuta no plantio, colheita e secagem do fumo.
Comprou a máquina, mas com a advertência de cuidados para que nenhum estranho soubesse que era proprietário de tal maravilha, e só fazê-la funcionar em casa, para evitar problemas com a polícia. Voltou a casa sorrindo, imaginando já como coisas do passado, as estufas, as enxadas e o trabalho árduo de agricultor, e deleitando-se com projetos de aquisições sem fim, pois a maquininha era mesmo fantástica.
Chegando ao lar, convocou mulher e filhos e deu-lhes a grata notícia: aqui nesta casa, ninguém mais vai precisar trabalhar de hoje em diante. Tirou do saco a máquina de dinheiro, pô-la sobre a mesa, e depois de dizer aos boquiabertos familiares, do que se tratava, colocou um papelzinho na entrada da máquina e girou com solenidade a manivela ... e eis que sai uma nota novinha de 500 do outro lado, para espanto e alegria de todos.
Novo papelzinho e novo giro na manivela e eis o espanto... o papelzinho sai em branco... Talvez faltasse tinta...
Como se tratava de um aparelho fácil de abrir, fê-lo, descobrindo que nada havia no interior que pudesse pintar um papel transformando em dinheiro.
Apavorado, teve como primeira idéia, chamar a polícia, do que foi prontamente dissuadido pelos circunstantes, já que ter uma máquina de fazer dinheiro em casa, era uma coisa altamente suspeita e ilegal. Afinal, ele não era a Casa da Moeda. Convicto que de boca fechada devia absorver em segredo o incrível prejuízo - um ano de safra de fumo, - não sem grandes dores e desapontamentos, tomou da máquina famigerada e lançou-a num poço do rio Itajaí do Sul.
O assunto veio ao conhecimento da cidade, obviamente algum dos garotos da família não soubera guardar o segredo, e assim, todos conheciam a aventura, a ponto de sempre que as finanças andavam meio apertadas, dizerem gracejando: - Sou obrigado a pegar a tarrafa e dar umas tarrafadas no poço lá em Santa Tereza, prá ver se consigo apanhar a máquina do Wantring. É a única forma de me safar …
Transcrição na íntegra:
Dr. Fernando Böing em “Homenagem a Ituporanga”, organizado por Nilson José Boeing, editora Nova Letra, 2012, pág. 62-64.